Depois
de horas embalando coisas, jogando outras fora, dispensando algum tempo nas
boas recordações trazidas por algum objeto, chego à conclusão de que é incrível
como a vida da gente cabe em caixas.
Devo
dizer que levei um bom tempo até aceitar essa realidade. Juntei uma série de
desculpas para postergar essa mudança. Ao final percebi que cedo ou tarde ela
deveria acontecer e quanto mais tempo eu levasse mais eu sofreria.
Acordei
de um salto num dia desses e joguei a dúvida e a incerteza fora. Tem um caminho
a minha frente, gritando que preciso seguir enfrente, é só dar o primeiro
passo... Mas não é fácil, são muitas lembranças.
Nessa
casa, que hoje deixo, vivi momentos maravilhosos, vivi momentos tristes também.
A solidão foi uma de minhas melhores companheiras e devo dizer que ela foi
responsável por algumas realizações também. No silêncio ou no barulho de todos
os equipamentos ligados ao mesmo tempo, descobri a maravilha de se estar com
quem à gente gosta, nesse caso eu. Tudo bem pode ser meio narcisismo, mas
sempre gostei da minha companhia.
Nas
tardes, quando ficava absorta, apenas contemplando o verde que me envolvia e o
som maravilhoso de pássaros se preparando para dormir conseguia fazer longas
viagens, escrevia no tempo o que mais tarde viria se materializar em palavras
no papel. Quantas vezes me deixei adormecer ao sol, pelo simples prazer de
sentir seu calor e ser acariciada pela brisa que tocava minha pele e me trazia
sempre a sensação de liberdade, o cheiro adocicado da grama recém-cortada, os
sons do vento abraçando os galhos das árvores.
Viver
por tanto tempo rodeada de verde em seus diversos matizes sempre me trouxe
muita paz. Tomar o café da manhã observando o sol nascer e iluminar tudo em
volta. Ficar ali à mesa contemplando o dia e criando e imaginando tantas
coisas. Quantas vezes me peguei falando sozinha entre uma xícara de café e
outra. Mas é chegada a hora de deixar para trás esse momento da minha história.
Esse capítulo foi muito bem escrito e é preciso dar vazão aos que virão. Com
certeza o conteúdo dentro das caixas não chega nem perto do que se acumulou em
minhas memórias. As lágrimas não faltarão e vão molhar o meu rosto quando olhar
para trás e vir os cômodos vazios, mas vou fechar a porta e seguir meu novo
caminho.
Retratei em palavras o que
essa casa sempre foi para mim,
A
casa branca
A casa branca que brota
Com sua força e energia
Quadrada em sua forma
Ilhada por tantas árvores
Parece arrogante para quem
olha
Mas ao se entrar nela
Descobre no cheiro
E na delicadeza dos móveis
Uma suavidade que encanta
Quem nela entra
Sente-se acolhido, aconchegado
Adormece em seus braços
Com a segurança de se estar
Completamente abrigado
A casa branca da rua
De números confusos
Tem em cada canto um suspiro
E ás vezes um sussurro
São as revelações de tempos
idos
De saudades jamais
esquecidas
De momentos intensamente
vividos
Essa casa guarda meus
segredos
Essa casa por muito tempo
Alimentou meus sonhos e
desejos
A casa branca se vai
enquanto matéria
E se materializa enquanto
lembrança...