segunda-feira, 16 de julho de 2012


Frio, vento e fome
E a solidão que consome
Nas noites geladas de inverno
Escondidos debaixo de papelões
Dormem em névoas de miséria
Amontoados de pele e ossos
Alimentados apenas de lamentações
Esquecidos do tempo, dos anos
Seres que já nem se julgam mais humanos
Marginalizados e descriminados
São invisíveis à sociedade hipócrita
Que rouba sua dignidade e nega-lhe o pão
São homens, mulheres e crianças
Jogados no mundo sem proteção
Misturam-se ao lixo e a imundice
Daqueles que se negam a olhar para o chão
Gritam palavras de ordem, apresentam-se
Como bons moços e moças
Mas fazem cara de nojo para toda essa podridão
As feridas abertas da miséria humana
Contaminadas por preconceitos e dissimulação
Não há dignidade quando não se tem pão
Num país em que nem todos
Sabem que têm direito a um nome 
São pobres miseráveis que ainda buscam 
Em suas velhas panelas vazias
Algum alimento que mate sua fome
E choram o choro dos que não tem voz
Com olhos empoeirados e esfarrapados
Vão se largando no mundo
E morrendo todos os dias
Acostumados à invisibilidade
Insignificância e mediocridade.



Bela vê a vida pela fresta do portão.
Tudo que vem aos teus olhos
Vem pela metade, com imagens cortadas,
Mas não pense que Bela sofre de solidão
Ao contrário, ela sorri para os pés que transitam pela calçada.
Às vezes, Bela dança com uma desenvoltura invejável
Quando o sol torna-se desagradável, Bela nem dá bola
Dá uma olhada de desdém, vira-se e se recosta com ar de bela dama.
Com olhos lânguidos e corpo relaxado põe-se a dormir
Ao entardecer Bela se levanta, se recompõe e dirige-se ao portão,
Ela sabe que haverá passos rápidos num vai e vem frenético
De carros, ônibus, bicicletas e os seus, preferidos, pés.
Eles são de variadas cores, alguns altos, outros baixos
Alguns correm, outros caminham e outros param...
Bela não liga para os rostos, não se importa com eles,
Bela é fascinada com essas formas estranhas.
Alguns amigos param, olham no seu único olho,
Resmungam alguma coisa e vão embora.
Bela não é tímida e é muito educada
Deitada, olhando pela fresta do portão,
Bela compõe seu mundo nas fantasias que povoam
E alimentam seu canino coração.
Bela vê a vida pela fresta do portão... 

Morte


Na eminência da morte os olhos perdem o brilho,
E o espírito parece se despedir desse mundo.
Existe uma tristeza que não sei de onde vem,
Talvez a despedida do plano que lhe abrigou,
Dos lugares e das pessoas que lhe abraçou.
Não sei, é impossível analisar, interpretar
Existe um distanciamento do tempo 
Nada mais parece fazer sentido 
Ao ouvir “já vivi muito, meu tempo se esvai”
Não existe mágoa, amargura ou frustração
Nessa frase simples, mas tão cheia de emoção,
Apenas a melancolia e a certeza do partir.
A morte que não vem no corpo de Brad Pitt
Chega silenciosa e a quem merece, vem carinhosa.
A lágrima que lava o rosto enrugado é de saudade,
Ou da certeza de tão desejados reencontros.
A morte não é essa dama de vestes negras
E de foice na mão, ela é leve e fluida.
A morte não evita a dor, mas desperta amor,
Ela apenas modifica as muitas fases da vida.
Quero que a minha passagem venha 
Numa fria e ensolarada tarde de inverno
No azulado frio da despedida
Assim terei a certeza de que o espírito é eterno
Na beleza do sol que se põe
Quero adormecer nos braços do horizonte
E despertar livre das vestes carnais
No caminho para aprender e talvez um dia renascer.

E aí vem você, todo dengoso e cheiroso Roça meu pescoço, você é habilidoso Sabe sussurrar em meus ouvidos Palavras que fazem meus pêlos e...