domingo, 13 de novembro de 2016


Foto: Aldo Pedrosa
Tela do artista cubano Alexis Iglesias que tive a honra de fazer o texto crítico e está no livro
Obras comentadas: doação a coleção do MUnA, organizado por Andrés Hernandes.

Como dois encontros, com grupos de diferentes pessoas, podem promover reações em nosso corpo. O primeiro, um grupo de mulheres de faixa etária diferentes, me fez sentir o ser mais estranho do planeta, o silêncio que se fez em mim era quase um grito por ar puro. A conversa girava em torno de roupas, sapatos, academia, filhos, comida, fofocas de TV, homens, um verdadeiro festival de hipocrisia, preconceito e futilidades. Uma delas questionou por que eu não fazia academia, iria me ajudar muito, e com certeza eu envelheceria com muito mais qualidade de vida. Não discordo dela, só não suporto academia. Mas a parte mais engraçada foi ela me dizer "pensa Jackie, você chegar aos 50 com tudo em cima, durinha, com corpinho de 30..." Fiquei entre dizer que eu já tinha 50 com corpinho de 30 e me manter calada. Mantive-me calada, com aquele meu olhar cínico e dissimulado, que quem me conhece sabe o quanto é perturbador. Outra me questionou a falta de um namorado, e como eu conseguia ficar sem homem "isso é um absurdo, eu não consigo passar uma semana", mais uma vez o silêncio se fez mim. Sair "pegando" todos por aí, sem a menor noção de responsabilidade e respeito por mim mesma não faz parte da minha relação com a vida.
Meu olhar ia de uma a outra sempre pensando em que mundo essas mulheres habitavam, que certezas eram aquelas de felicidade trabalhada na academia, no casamento, na maternidade, no dinheiro jogado fora com coisas tão supérfluas. Ora ou outra meus lábios se mexiam e alguns sons saiam como: é... pois é... uhummm... monossílabos e apatia. Me esforcei ao máximo para me manter naquele ambiente que, com toda certeza, não me pertence mas que é um excelente laboratório para análise de personalidade,  mas ao final de uma hora já estava esgotada, pedi licença, cumprimentei a todas e fui embora com um sentimento de vazio, de ausência de energia, como se toda a energia do meu corpo tivesse sido drenada, estava sonolenta, pesada e com dores.
O segundo grupo, muito mais diversificado, começou com a abertura da exposição do MUnA, seguiu para um restaurante, e terminou numa cervejaria. Passamos juntos mais de 6 horas, havia uma troca de conhecimento, ninguém tinha certeza de nada, mas havia o desejo constante de evoluir. Ali estavam indivíduos que se permitiam estar presente com o outro. Os assuntos variavam da política e economia atuais do país, passava por filmes e séries, viagens, livros, muita risada, reflexões interessantes, a alquimia da cerveja e a tão estimada filosofia de boteco, como diz Rodrigo "no fim tudo acaba em morte..." e é verdade, podemos fazer tudo o que quisermos, viajar, trabalhar, fazer planos, mas a única certeza é que um dia iremos partir para outra dimensão. Durante todo o tempo que passamos juntos, NINGUÉM pegou o celular, NINGUÉM reparou se o outro estava bem vestido ou não, NINGUÉM questionou as escolhas do outro. 
Cheguei em casa quando o dia despertava com suas cores e perfumes, enchi um copo de água e enquanto bebericava fiquei ali sentada, observando o céu mudando de cor, estava feliz, energizada, relembrando aqueles momentos que me foram tão caros. Nem o cansaço dos últimos dias, ou o estresse pré abertura de exposição me abateram. Havia em mim o sentimento de dever cumprido e a certeza de que é preciso estar com pessoas que nos agreguem valores, que nos possibilitem ver a vida com muito mais cores, com muito mais luz. É importante respeitar as escolhas e opiniões alheias, mas é muito mais importante nos manter mental e fisicamente saudáveis, e são nossas escolhas que nos permitem viver com brilho nos olhos e sorrisos na alma. 
Entre o primeiro e o segundo grupo, não há a menor dúvida fico com o segundo, as sensações deixadas no corpo foram de leveza, relaxamento e profundo respeito pelo ser que habita em mim.

E aí vem você, todo dengoso e cheiroso Roça meu pescoço, você é habilidoso Sabe sussurrar em meus ouvidos Palavras que fazem meus pêlos e...